terça-feira, 26 de agosto de 2014

Dia 10 - Paris e uma mão cheia de "não" (excerto do primeiro esboço do livro!)


Quinze minutos depois começou uma azáfama de pedidos e explicações: durante quatro horas alternei entre esperar, tocar piano (sim, também aqui havia um), explicar a minha história a revisores e chefes de comboio e ouvir, invariavel-mente, um “non” como resposta. Pelo meio tive ainda tempo para dar o meu lugar ao pai de uns meninos pequenos que se tinham sentado ao meu lado, de ler mais uns quantos capítulos do meu livro, de voltar à bilheteira para me aquecer e tentar a sorte com outro funcionário (sem resultado), e de recordar da eterma estratégia que aprendera nos EUA: recebes um "não", agradeces e dizes para ti próprio “Next!”. 
Foi assim até ao último comboio: Hendaye, Bourges, Tours, Toulose, Brive la Gallarde, Albi, Luchon, Tarbes e outros tantos destino para onde eles partiam um a um sem mim... Até o Elipsos para Barcelona tentei, mas nada feito: à meia-noite e meia saiu o último comboio, e eu ainda estava em Paris... e agora?
Sentei-me na sala de espera da gare, agora vazia, a pensar na minha vida e no que iria fazer a seguir. Contabilizei dezassete “nãos” ao longo do dia, o que era um record absoluto, e se era verdade que tinha sobrevivido também era claro que assim não iria a lado nenhum. Saboreei por isso as bolachas que sobravam e decidi ficar por ali: pelo menos estava num sítio calmo, minimamente limpo, quente e seguro, e isso eram luxos que não poderia desperdiçar! Recostei-me na cadeira e preparei-me para dormir... achava eu! Dez minutos depois ouvi atónito o anúncio no sistema de som: “é uma da manhã e a estação vai fechar. Pede-se a toda a gente que saia”... o quê? A estação fechava e toda a gente era posta na rua?! Com aquela é que eu não contava! Perguntei à senhora das informações se era mesmo assim, ao que me respondeu que sim, que teria que deixar o edifício entretanto. E foi assim que me vi na rua, em Paris, à uma da manhã e sem fazer a mínima ideia de onde poderia passar a noite... Seria esta a minha primeira noite na rua? “Não”, pensei, “nem penses!”.
NOTA: este texto é apenas um excerto do primeiro esboço do livro, não o texto final. 

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